segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

As exigências da encarnação do Verbo



   Oi Filoteu! Ainda no rastro do Natal, pensei postar por aqui uma reflexão sobre as exigências do mistério da encarnação do Verbo em nossas vidas. Isso mesmo. Precisamos assumir alguns princípios que a própria Palavra de Deus e o testemunho vivo da Palavra feita carne nos dá e de nos solicita.

   O apóstolo Paulo, escrevendo aos filipenses diz que o Cristo que tinha condição divina "...esvaziou-se a si mesmo e assumiu a condição de servo tomando a semelhança humana. E achado em figura de homem, humilhou-se e foi obediente até a morte, e morte de cruz" (Flp 2, 6-8). Mesmo conservando a natureza divina, pois o Verbo é consubstancial ao Pai, Jesus é homem e enquanto tal não reivindicou para si uma igualdade de tratamento de tão alta dignidade. A atitude de Jesus se apresenta então oposta à de Adão que quis ser como Deus: "sereis como deuses, versados no bem e no mal", assim disse a serpente infernal ao primeiro pai (ver Gn 3, 5). Que significa ser como deuses, ou igualar-se a Deus? Bem mais que criar as coisas, fazer milagres e dispor dos acontecimentos e demais infinitos poderes, significa definir o que é certo e o que é errado, definir o bem e o mal. Já pensaste sobre isso? Quantas vezes em nossas vidas, o bem e o mal, o certo e o errado foram postos ou definidos e acima de tudo escolhidos a partir de critérios diferentes do que Deus pensa e do que Deus quer! Vale uma reflexão! 

  Já comentamos o sentido do que São João nos dá ao afirmar que o "Verbo de Deus se fez carne" (Jo 1, 14) e lá falamos da fraqueza assumida, do assumir as contingências humanas, aos limites e dores, necessidades e carências. Algo impensável para um Deus? Com certeza, mas esse Deus que assumiu a natureza humana, sendo infinito e todo poderoso, sendo infinita e eternamente belo, bom e verdadeiro, fonte de toda sabedoria, bem Ele mesmo, TEM MANIA DE POBREZA E DE PEQUENEZ! Entendeste filoteu o quanto o orgulho humano cai por terra? Compreendes, portanto, que a vaidade humana é uma mentira escrachada e esculachada? Êta mentira descarada!

   Sabe filoteu, esse abaixar-se do Verbo encontra na encarnação o seu ponto inicial, mas sua manifestação, digamos visível, aconteceu exatamente na gruta de Belém em que Ele se manifestou na carne de uma criança. Pobre e pequeno. Ora, lembro-te do que ensina o grande João da Cruz, o doutor místico:

 "Ter constante desejo de imitar a Jesus Cristo em todas as coisas, conformando-se com a sua vida, a qual deve considerar para saber imitá-la e comportar-se em todas as coisas como ele se comportaria. Para poder fazer isto, é necessário renunciar a qualquer apetite ou gosto que não seja puramente para honra e glória de Deus, e ficar sem nada por amor dele que nesta vida não teve nem quis ter mais do que fazer a vontade e seu Pai, à qual chamava sua comida e seu manjar" (São João da Cruz, Ditos de Amor e de Luz, n. 158).

   Por isso, ser pobre de espírito, como Jesus nos ensina é viver bem essa imitação. Uma imitação que lança as bases da liberdade interior, aliada indispensável dos que desejam trilhar estes caminhos de cristificação. Trata-se de uma disposição de desprendimento profundo, radical e essencial a tudo que não seja Deus. Por isso, o pobre de espírito é disponível para o Reino e não está apegado a nada, a ninguém, a nenhum projeto, até mesmo à própria santidade que pensa ser santidade. Olhar, contemplar, acolher para imitar o Senhor exige que sua vida e suas escolhas, suas palavras e sua mentalidade estejam profundamente fincadas na existência de cada um dos seus discípulos e amigos, servidores e vocacionados. Imitadores, seguidores é o que tais pessoas são chamadas a ser. Ensina-nos o Senhor Jesus:

"Se alguém quer servir-me, siga-me; e onde eu estou, aí também estará o meu servo. Se alguém me serve, meu Pai o honrará" (Jo 12, 26).

Para terminar, eu te digo, Filoteu algo profundamente necessário: os amores dos místicos foram o presépio, o calvário e o sacrário. Serão estes os teus amores?

Um abraço e bênção do padre.

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